Categoria - Aconselhamento Cristão

CASAMENTO E FAMÍLIA: EVENTO OU PROJETO DE DEUS?

Magno Paganelli

Introdução

Imagine se fosse possível voltar no tempo. Considere que você pudesse voltar no tempo e refazer o seu casamento ou, caso seja solteiro, pudesse refazer a sua família, você faria as coisas diferentes? Você mudaria o seu cônjuge ou você mesmo? Mudaria seus pais ou irmãos? Agora, quando pensamos profundamente sobre a origem de todas essas pessoas à nossa volta, não somente na família, mas na sociedade, no mundo e na história, todas elas tiveram uma mesma origem: no Gênesis, na Criação. E todas proveem da mesma história em comum, como lemos:

“E disse Deus: Façamos o homem à nossa imagem, conforme a nossa semelhança; e domine sobre os peixes do mar, e sobre as aves dos céus, e sobre o gado, e sobre toda a terra, e sobre todo réptil que se move sobre a terra. E criou Deus o homem à sua imagem; à imagem de Deus o criou; macho e fêmea os criou. E Deus os abençoou e Deus lhes disse: Frutificai, e multiplicai-vos, e enchei a terra, e sujeitai-a; e dominai sobre os peixes do mar, e sobre as aves dos céus, e sobre todo o animal que se move sobre a terra. E disse Deus: Eis que vos tenho dado toda erva que dá semente e que está sobre a face de toda a terra e toda árvore em que há fruto de árvore que dá semente; ser-vos-ão para mantimento. E a todo animal da terra, e a toda ave dos céus, e a todo réptil da terra, em que há alma vivente, toda a erva verde lhes será para mantimento. E assim foi. E viu Deus tudo quanto tinha feito, e eis que era muito bom; e foi a tarde e a manhã: o dia sexto.” (Gn 1.26-31; ênfase minha)

Neste clássico texto bíblico lemos e aprendemos que “tudo quanto [Deus] tinha feito […] era muito bom”. Devemos supor que nesta declaração de bondade ou de qualidade na criação de Deus, casamento e família estão incluídos, e essa criação será melhor detalhada no capítulo 2.

Não será exagero admitir que a família sempre esteve nos planos de Deus, desde o princípio. Em Gênesis 3.20, nós lemos: “Adão chamou Eva à sua mulher, porque ela foi a mãe de todo vivente” (ênfase minha). Esta é a parte em toda a Bíblia que descreve o nascimento da família. Mais à frente, lemos em Gênesis 7.1 o seguinte: “Depois disso, o Senhor falou a Noé: Entra na arca, tu e toda a tua família, pois tenho visto que és justo diante de mim nesta geração” (ênfase minha). Finalmente, em Gênesis 12.3: “Abençoarei os que te abençoarem e amaldiçoarei quem te amaldiçoar; e em ti serão benditas todas as famílias da terra”.

Quando chegamos ao Novo Testamento, notamos que ele começa com o surgimento de Jesus por meio da sua família. Sua família é de Nazaré, cidade insignificante, sem história. Sua mãe, Maria, uma virgem desconhecida da periferia. José, um carpinteiro inexpressivo, ex-sacerdote sem ocupação. E Deus não escolheu introduzir o salvador do mundo, Jesus, das fileiras de um exército ou dos altos escalões políticos do Império Romanos, nem das castas sacerdotais do Templo judeu, ou quem sabe poderia tê-lo apresentado ao mundo a partir dos meios culturais gregos, mas não. Deus escolheu apresentar Jesus ao mundo por meio da família. É o que o texto demonstra (Lc 1.26-37).

1. A perspectiva divina: as coisas feitas por Deus revelam ordem, equilíbrio, finalidade.

A Criação de Deus foi realizada tendo um propósito específico, tendo um projeto claro. Deus parece ser guiado por Sua vontade (“boa perfeita e agradável”, Rm 12.1-2), manifesta em projetos/planos, expressos nas Suas promessas.

Isaac Newton (1642-1727), um dos mais renomados cientistas da história, escreveu: “O belíssimo sistema do sol, planetas e cometas, só poderia provir da vontade e do controle de um Ser inteligente e poderoso”.

Homens e mulheres de Deus são guiados por projetos pessoais e pelas promessas de Deus. Moisés tinha um projeto e uma promessa; Neemias tinha um projeto e uma promessa; Paulo também e o mesmo aconteceu a Jesus. Por esse mecanismo, poderíamos dizer, também foi estabelecida a Igreja, como lemos em Efésios 4: “Ele deu uns para … com o fim de …”: projeto e promessa orientando a finalidade de cada dom dado a Igreja para a sua edificação.

Embora Jesus tenha dito que no mundo teremos aflições (Jo 16.33) e passaríamos por maus bocados, é razoável que em meio aos nossos problemas, é a vontade de Deus que sejamos bem-sucedidos em tudo. Em Lucas 14.28-29, lemos:

“Pois qual de vós, querendo construir uma torre, não se senta primeiro para calcular as despesas, para ver se tem como acabá-la? Para não acontecer que, depois de haver posto os alicerces, e não a podendo acabar, todos os que a virem comecem a zombar dele, 30 dizendo: Este homem começou uma construção e não conseguiu terminá-la.” (ênfase minha)

Querendo que cheguemos ao acabamento dos projetos, o Senhor quer êxito naquilo em que nos envolvemos, e isso nada tem a ver com autoajuda; é a expressão declarada de Deus e sua vontade, conforme o texto. Tudo o que Deus faz por nós e tudo de errado que nós fazemos é matéria-prima para Deus trabalhar em nós e finalmente nos abençoar. Romanos 8:28,31 diz: “Sabemos que Deus faz com que todas as coisas concorram para o bem daqueles que o amam, dos que são chamados segundo o seu propósito. Que diremos pois a essas coisas? Se Deus é por nós, quem será contra nós?”.

Otto von Bismarck afirmou certa vez: “Se é errando que se aprende, eu prefiro aprender com os erros dos outros”. Mas quem de nós tem disciplina para aprender dessa maneira?

2. A perspectiva humana: quando nos casamos, estamos diante de um evento que pode ou não ser um projeto.

O casamento/família como evento

Em nossa sociedade, o casamento pode ser compreendido (e por muitos casais ele é) como um evento quando os noivos querem resolver problemas do passado:

– Sair da casa dos pais (como Rebeca em Gn 24.51);– Dar significado a suas vidas (síndrome da imaturidade);– Experimentar novo status social (como nos casamentos por conveniência ou nas alianças feitas pelos reis de Israel);– Alguém para “pagar as contas”;– Livrar-se do tédio;– Fazer sexo sem culpa;– Vingar-se da ex-namorada ou namorado.

Um casamento tipo evento é o de Rebeca e Isaque

Rebeca e Isaque (Gn 27 eram dois jovens com orientações religiosas opostas que se casaram. Qual a missão de Deus para cada família? Para Isaque, os princípios religiosos determinavam o sentido da vida social, familiar e as demais áreas. Ele era filho de uma família que tinha a promessa de Deus; não será exagero afirmar que ele estava consciente disso. Para Rebeca, valia aquilo que funcionava. Ela era pragmática. No decorrer da vida em família, ela deixou isso bastante claro em sua predileção pelo filho Jacó em detrimento de Esaú.

Por conta dessa sua predileção, Rebeca foi incapaz de prever a reação de Esaú. A ela faltou experiência em:

– Antecipar crises, moderar interesses e na solução de conflitos– E, principalmente, no conhecimento sobre a missão da família a qual passou a pertencer, dentro do plano de Deus. Ela tinha interesses diferentes de Isaque, destoando do caminho espiritual a ser seguido.Isso pode ensinar algo que durante muito tempo foi dito nas igrejas, mas hoje raramente é mencionado: não se ponha sob jugo desigual (2Co 6.14).

Quais foram as consequências desse desconhecimento ou dessa divergência entre a formação de ambos os jovens, Rebeca e Isaque? Se tiver o cuidado de ler a história, verá que

– Para Rebeca, ela perdeu seus dois filhos “num só dia” (Gn 27.45);– Demonstrou falta de unidade com seu marido;

Para Isaque:

– Ele foi enganado, em última instância, por sua esposa;– Ficou sem o filho Jacó;– Foi profundamente abalado (Gn 27.33).

Para Esaú, viveu cheio de amargura (Gn 27.34); guardou rancor e nutriu desejos de morte contra o próprio irmão (Gn 27.41).

Finalmente, para Jacó, não fosse a bênção herdada, sua vida seria só desgraça. Precisou fugir do irmão, foi enganado durante sete anos por Labão, seu tio, teve o salário trocado, foi privado da família, viveu mais de vinte anos amedrontado por causa da ira de Esaú e, finalmente, colheu o engano que praticou na experiência com suas esposas e seu filho José.

Ashley Madison, site especializado na promoção de encontros extraconjugais, fez uma pesquisa onde levantou dados sobre a afiliação religiosa dos usuários nos Estados Unidos. E conclui: “A maioria das pessoas que buscam um relacionamento fora do casamento pelo site se identifica como cristãos”:

– 48% se classificam como evangélicos ou protestantes;– 23% se identificam como católicos;– 24% dos homens e 32% das mulheres que usam o serviço de encontros extraconjugais afirmam que oram regularmente;– 18% dos homens e 11% das mulheres consideram a traição um pecado;

A pesquisa ainda mostrou baixo percentual de usuários judeus, muçulmanos e hindus, o que é uma severa crítica da nossa situação espiritual enquanto cristãos.

As feridas do adultério

O adultério sempre criará feridas que as pessoas insistem em sublimas quando estão seduzidas por alguém fora do casamento. O cônjuge traído é ofendido em mais de uma área: a confiança é abalada, é exposto à humilhação pública, se pego de surpresa tem a intimidade exposta.

Os filhos não estão imunes à vergonha e aos problemas. Eles são a parte delicada da relação e são inocentes. Em geral, ficam desorientados, sem saber o que fazer e em quem confiar.

E engana-se quem pensa que o único que se sai mais ou menos bem é quem trai. Errado. A pessoa que trai não passa sem arranhões profundos, pois de cara não pode garantir que terá de volta 100% da confiança que tinha antes das pessoas de sua família, nem das pessoas do seu meio social. Ela terá que ter paciência, socialmente ficará marcada, pois a nossa sociedade perdoa pecados graves, mas não o adultério. Há uma hipocrisia velada na sociedade brasileira.

Entre nós cristãos, precisamos considerar que também o Senhor é uma das partes ofendidas: a Palavra de Deus diz que não devemos adulterar (o sétimo mandamento), porque é transgressão a Lei de Deus e isso implica ofensa contra ele. Como ele é um Deus gracioso, podemos contar com o auxílio quando nos arrependermos: “Meus filhinhos, estas coisas vos escrevo para que não pequeis; e, se alguém pecar, temos um Advogado para com o Pai, Jesus Cristo, o Justo. E ele é a propiciação pelos nossos pecados e não somente pelos nossos, mas também pelos de todo o mundo” (1Jo 2.1,2).

O casamento/família como projeto

O outro modo como os casais encaram o casamento é como se fosse um projeto que tem tudo para ser bem-sucedido. Isso ocorre quando vemos dois elementos presentes:

– O casal manifesta interesse na vontade de Deus (consciência cristã desde o namoro, preocupação com a obra, desejo de formar família, respeito entre as famílias, planejamento financeiro, responsabilidades mútuas);– Diante dos tropeços, eles não desistem de andar juntos. Todo casal tropeça, mas há cônjuges que querem mudar de calçada sozinhos.

Na sociedade pós-moderna, ou seja, segundo o espírito do nosso tempo, o que vale é o resultado e o prazer imediatos. Passamos a maior parte do dia sendo bombardeados pelas ideias da cultura sem Deus, seja na faculdade, na sociedade em geral, mas especialmente nas empresas onde o espírito de equipe vem como influência pressionando-nos fortemente. Nesse “espírito” do nosso tempo, pragmatismo e hedonismo reinam.

E isso tudo converge para um fim: sucesso, vantagens, lucros, realização pessoal, valorização profissional, manutenção do status e permanência no grupo. Costumo chamar isso de “espírito de Roberto Justus”, conforme aquele programa que era apresentado por este empresário. No programa que confrontava equipes profissionais numa competição, quando alguém errava o apresentador dizia “está demitido”.

Acontece que esse conceito ou espírito do nosso tempo não pode ser usado nas relações familiares entre casais cristãos. O que marca uma família pode ser o espírito de equipe, mas:

O fim não é o sucesso segundo o padrão humano: se os objetivos não forem atingidos, aquele que fracassa não é cortado do convívio: a família o restaura e prossegue em sua missão.

3. O Diabo entrou na Criação de Deus e desordenou o jardim.

Deus voltou atrás e consertou o estrago quando o primeiro casal sofreu a Queda? Não, ele seguiu em frente. Fez roupas de pele para o casal que se vestia com folhas de uma planta; confundiu as línguas em Babel quando o povo se uniu para ficar mais forte; enviou o dilúvio para purificação da humanidade quando essa se tornou má; chamou Abraão e começou uma nação quando o povo da Mesopotâmia se tornou politeísta; enviou Moisés para tirá-los do Egito quando o povo era escravizado e não conhecia bem o Senhor e deu um rei quando o seu próprio povo o rejeitou.

Deus fez mais: durante a monarquia em Israel, ele enviou profetas quando o povo se desviou, mandou-os para o exílio quando o pecado extrapolou e enviou Jesus quando chegou a plenitude dos tempos.

Deus é o Senhor da História da humanidade, não somente do povo de Israel. Deus é o Senhor da história da sua vida, do seu casamento e da sua família! Se as coisas andarem mal, ele não pede que voltemos atrás, mas que sigamos, com ele, não sem a sua presença.

Não é preciso imaginar uma volta ao tempo, a um casamento ideal. É preciso seguir em frente e seguir os planos e promessas de Deus para o casamento e para a família. Deus faz novas todas as coisas. “Tudo isso provém de Deus, que nos reconciliou consigo mesmo por meio de Cristo e nos deu o ministério da reconciliação, ou seja, que Deus em Cristo estava reconciliando consigo o mundo, não levando em conta os pecados dos homens” (2Co 5.18-20).

Casais e famílias destruídas precisam procurar um projeto de vida conjunta e nesse conjunto é preciso que Jesus esteja com eles.

Considerações finais

A família de hoje tem os mesmos desafios do passado: testemunhar Deus na terra, espelhar seus atributos de amor, misericórdia e governo, o que inclui o cuidado com a natureza e seus recursos. Isto é chamado em Teologia de Mandato Cultural. É o projeto original de Deus desde a Criação e não há qualquer evidência de que o Senhor o tivesse abolido: precisamos considera-lo em nossas vidas.

E, finalmente, que prevaleça o conselho de Paulo: “sujeitando-vos uns aos outros no temor de Deus. Assim também vós, cada um em particular ame a sua própria mulher como a si mesmo, e a mulher reverencie o marido” (Ef 5.21,33).

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